Porto vai acolher o primeiro banco norte-americano;

Ricardo Valente, vereador da Câmara Municipal do Porto, revela
Porto vai acolher o primeiro banco norte-americano
“A sustentabilidade de uma política verdadeiramente social nunca pode pôr em causa a criação de riqueza” – afirma Ricardo Valente.
“O Porto é visto como um centro de excelência do ponto de vista da instalação de empresas” – afirma Ricardo Valente. Em entrevista à “Vida Económica” o  vereador da Câmara do Porto, destaca a atração para a cidade e área metropolitana de um número crescente de empresas estrangeiras que criam emprego qualificado.
A InvestPorto, entidade especializada da autarquia para apoiar o investimento,  acompanhou nos últimos nove anos mais de 500 projetos de investimento na cidade, com um valor global superior a mil milhões de euros e mais de 17 mil postos de trabalho criados.
Ricardo valente afirma que está para breve a chegada ao Porto de um grande banco norte-americano, somando-se ao Natixis e BNP Paribas, assim como de um centro europeu de empreendedorismo, robótica e inovação na área saúde, da Organização Mundial de Saúde. 
 
Vida Económica -Tem havido uma evolução favorável em termos de atratividade do Porto no  investimento estrangeiro?
Ricardo Valente - Sim. Nos últimos oito anos, somos a área metropolitana que mais cresce no país e na Europa também.
Somos a área que, em termos relativos, mais investimento direto estrangeiro recebe em Portugal.
 
VE - Quais são os fatores de atratividade?
RV - O talento. Portugal é hoje na Europa o terceiro país com mais graduados na área de engenharia. O eixo Aveiro-Porto-Braga é na Europa o maior produtor de graduados em Ciência, Tecnologia e Engenharia. Esse fator é muito importante.
O talento é claramente  o fator chave. Temos talento disponível, temos talento barato. Isso atrai as empresas. A transformação digital favoreceu muito Portugal porque transformou o mundo numa lógica de busca de talento graduado, de licenciados. A evolução da estrutura educativa do país é a grande vitória de Portugal depois do 25 de Abril. Temos excelentes universidades e uma qualidade de ensino muito boa. 
Temos também um domínio de línguas estrangeiras muito importante, o que  é fundamental. Quando nós olhamos para Espanha ou Itália, eles são péssimos em inglês, isso significa que as empresas preferem claramente em primeiro lugar Portugal em vez de Espanha ou Itália. Eu diria que línguas e ética de trabalho é o que o português tem. Nós todos sabemos que os emigrantes portugueses lá fora trabalham mais, porquê? Porque têm ética de trabalho e trabalham para organizações bem estruturadas.
Quando trazemos investimento direto estrangeiro para o país, o que nós trazemos é organizações muito bem estruturadas. Trazemos empresas muito grandes e que são capazes de tirar muito partido da mão de obra que têm. O português é imediatamente reconhecido como alguém que trabalha muito bem, quando o trabalho é bem organizado, bem motivado. Esses são os fatores de atratividade do nosso país. 
Muito se fala depois na qualidade de vida. Evidentemente que sim. Entre trabalhar na Itália, na Estónia em Estocolmo, com 20 graus negativos, ou trabalhar em Lisboa, em Aveiro, no Porto ou em Braga, é completamente diferente do ponto de vista da qualidade de vida.
Isso é também um fator chave que nós sentimos nas empresas estrangeiras. Quando  as empresas estrangeiras colocam a questão de que em que escritório querem ir trabalhar, as pessoas escolhem o Porto, porque adoram o Porto.
 
VE – A atividade das empresas está a trair novos residentes e a contrariar a perda de população para a periferia??
RV - Isso é algo que mudou também no mundo. A economia das empresas voltou para o centro das cidades, que é algo maravilhoso. Aqui, ao nosso lado, temos a BMW com 1500 engenheiros que estão num escritório a fazer o design de um carro, a tratar do software de um veículo autónomo.
As cidades passaram a ser centros de economia, porque a economia hoje passou a ser digital. A parte menos relevante num carro são os eixos e as rodas, tudo isso é irrelevante. Os carros hoje são design e software. Isso é que é um carro. Isso é criatividade. O valor acrescentado hoje está muito aí. Portanto, acho que escolher o sul da Europa e Portugal é muito criador.
 
Os desafios da pressão imobiliária e da mobilidade
 
VE – Em termos de oferta de habitação, qual é a realidade?
RV - A questão fundamental é da habitação. O Porto é um território que começa a renascer, mas que perdeu população até 2017. A partir daí a população voltou a crescer, finalmente. Mas isso cria uma pressão de dinâmica imobiliária muito forte na cidade. Esse é o maior desafio que o Porto tem para vencer nos próximos anos, temos de encontrar forma de ter habitação acessível para que possamos ter empresas a chegar e ter pessoas a trabalharem perto das empresas. É um desafio que todas as cidades com sucesso têm hoje em dia, que é claramente a da pressão imobiliária.
Outro desafio é a mobilidade. A cidade está em obras e toda a gente se queixa. Quando as obras terminarem, daqui a três anos e tivermos isto direito, eu acho que as pessoas vão de facto valorizar.
 
VE – O que diferencia Portugal de outros países que também atraem investidores?
RV - Em relação à Índia e à Ásia, no setor tecnológico, a grande diferença é a qualidade dos recursos humanos. Quando vemos a BMW a fazer um carro autónomo, no software de segurança o que é cá feito nada tem a ver como o fabricado na Índia que, na prática, tem um trabalho pouco qualificado, de baixo valor acrescentado.
Isso é muito importante. Eu costumava dar o exemplo da Adidas na Maia, a empresa cortou postos de trabalhe para levar para a Índia, quais? Os de baixíssimo valor acrescentado. E depois criou em Portugal postos de trabalho de altíssimo valor acrescentado. Esse é o papel que nós pretendemos. Não queremos ser a “Índia da Europa”, nós queremos ser é a “Califórnia da Europa”. Esse é o nosso objetivo.
Nós queremos ser um centro de excelência. Queremos ter aqui empresas que de facto moldem o futuro do mundo e portanto têm que ter qualidade. 
Já passou a fase de querermos ter aqui as empresas de “call center” no centro da cidade, por muito respeito que têm, mas não é isso que queremos nem o que almejamos
Achamos que estamos num patamar diferente. Hoje chegam empresas em áreas muito distintas, muitíssimo diferentes (biotecnologia, nanotecnologia, etc.)
Vamos ter um centro europeu de empreendedorismo, robótica e inovação na área saúde, da Organização Mundial de Saúde, que vai ficar instalado no Porto. Isto é importante. Porquê? Porque reconhece a força que o Norte tem nas áreas da biotecnologia.
 
VE – O que ganha o país com a vinda dessas empresas?
RV - O que nos faz falta é darmos o salto em termos do ecossistema nacional, de ter a capacidade de olhar para isto e aprender. É algo semelhante ao que se passou no calçado. Começamos na subcontratação e a trabalhar para marcas estrangeiras e hoje o sapato português tem um preço médio de venda na exportação mais alto do que Itália. Significa que o setor ganhou muito pela chegada de empresas estrangeiras. Aprendeu a organizar-se, aprendeu a fazer e depois foi capaz de crescer.
Eu espero que esta chegada de investimento estrangeiro a Portugal, em diferentes setores, seja capaz de fazer o mesmo que foi feito na área do calçado.
 
VE - A InvestPorto é responsável por este investimento?
RV - Claro. Esta é a única Câmara do país que tem uma divisão de Investimento. Os dados são claros. Desde que criámos a investPorto em [2015,  acompanhámos mais de 500 projetos de investimento na cidade, são investimentos acima de mil milhões de euros na cidade do Porto, mais de 17 mil postos de trabalho criados na cidade que tem 230 mil habitantes, o que é um valor verdadeiramente extraordinário.
A InvestPorto permitiu que a cidade passasse a competir. A semana passada tivemos reuniões com três empresas estrangeiras, uma alemã, a outra francesa e a terceira dinamarquesa. Duas vão chegar à cidade e a outra vai crescer ainda mais no Porto. Em todas esta reuniões, o que fazemos é apresentar dados e mostrar às empresas onde elas podem crescer, o que podem fazer.
Isto é muito importante, este suporte que a cidade dá do ponto de vista do investimento.
 
VE – Que incentivos são dados ao investimento?
RV - Aprovámos o Regulamento de Isenções de Investimento. Somos a única câmara do país que tem um regulamento de incentivo ao investimento.
Na prática, vamos ter pela primeira vez um regulamento municipal e isentamos de derrama, de IMI e IMT os investimentos na cidade do Porto que cumpram determinados requisitos, em termos de criação de emprego, criação de emprego qualificado, um sistema análogo ao SIFIDE que existe no Governo central.
Entendemos que de facto a cidade tem de facilitar, agilizar o investimento porque nós precisamos de criar riqueza e depois pensar em distribuí-la e não distribuir a riqueza que ainda não se criou que é às vezes muito a lógica fácil mas não é sustentável 
A sustentabilidade de uma política verdadeiramente social nunca pode pôr em causa a criação de riqueza.
Quando a política social abafa a criação de riqueza ela torna-se insustentável porque não há política social sem riqueza. Isso é um mito, não existe
A cidade tem que criar riqueza, tem que atrair investimento para poder ser uma cidade com futuro num mundo que é cada vez mais competitivo.
O lema é: “o Porto não é uma cidade de Portugal é uma cidade do mundo”. Ou se quisermos reduzir é uma cidade da Europa.
Portanto, nós não nos vemos como uma cidade de Portugal, nós vemo-nos como uma cidade europeia.
 
Porto está no topo das cidades médias europeias
 
VE - Ao nível do emprego qualificado, o Porto consegue concorrer com as outras cidades europeias?
RV – Claramente. Há um mês atrás tivemos a chegada da Volkswagen Digital Solutions, que veio para o Porto porque reconheceu as vantagens que nós temos
Hoje, felizmente, o Porto é reconhecido. 
O “Finantial Times” coloca o Porto no topo das cidades médias europeias no ponto de vista de investimento nos últimos três anos. Não há nenhuma cidade europeia com esta capacidade de estar dos três primeiros lugares consecutivamente nos últimos três anos. Isso é muitíssimo relevante. Estamos a falar de cidades europeias. O Porto está no top três. Já foi número 1 neste ranking do “Finantial Times”.
 
VE – O Porto está à frente de Lisboa?
RV – Não é comparável, somos cidade intermédia, Lisboa é cidade grande. Em termos “per capita”, o Porto recebe mais empresas de grande dimensão. 
Nos últimos seis anos o orçamento da Câmara passou de 60 milhões para 400 milhões de euros e este crescimento cria desafios.
 
VE – Portugal concorre com a Irlanda?
RV - A Irlanda é um modelo económico menos sustentável do que Portugal. A Irlanda é Dublin. Assentou o seu crescimento com base em políticas fiscais agressivas, com muitos centros de refaturação. É uma Singapura dentro da Europa.
O que nós estamos a fazer é diferente. Entramos em cadeias de valor, de modo a termos um crescimento mais sustentável.


Investimento norte-americano chega ao Porto
 
O investimento direto norte-americano no Porto está a crescer. “Ganhamos uma nova centralidade face aos Estados Unidos. Segundo as estatísticas, já temos muito investimento direto americano na cidade, nunca tivemos empresas americanas e 4% das empresas que chegam são americanas. Alemanha e França, cada uma vale 20%, o Reino Unido vale 16%, Dinamarca 8%, a Suíça 8%.. Mas se olharmos para isto, são tudo países do norte da Europa – altíssima qualidade das empresas – e depois surgem os Estados dos Unidos, Holanda”, afirma Ricardo Valente.
“Estamos a falar aqui de empresas de primeira linha. Eu costumo dar este exemplo: quem está na costa oeste norte-americana, Nova Iorque, Portugal está mais perto do que a costa leste, ou seja, é mais rápido fazer Nova Iorque – Lisboa do que Nova Iorque-Los Angeles.”
“Isto significa que nós passamos a ter uma vantagem competitiva, evidente para mim. Nós temos um nível de vida muitíssimo mais barato. Os americanos estão finalmente a descobrir Portugal .
“Temos já prevista a chegada de uma grande empresa americana, na área financeira, aliás, é a primeira a chegar aqui ao Porto, que ainda não podemos divulgar porque é uma empresa cotada em bolsa.”

 

“A localização Porto é já reconhecida a nível global, acho que devemos ter orgulho e não vergonha ao afirmar isso. O Porto è visto como centro de excelência do ponto de vista da instalação de empresas.”

João Luís de Sousa/Virgilio Ferreira agenda@grupovidaeconomica.pt, 06/06/2024
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