IVA - Isenção transitória aplicável a determinados produtos alimentares
Ofício Circulado nº 30257/2023, de 14.4-2023, da Área de Gestão Tributária-IVA, da AT
A Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, publicada no Diário da República, 1.ª Série, n.º 74, introduz medidas fiscais de carácter excecional e temporário, em resposta ao aumento extraordinário do preço dos bens alimentares, prevendo a aplicação de uma isenção do IVA aos produtos do cabaz alimentar essencial saudável, elencados no respetivo artigo 2.º, com direito a dedução do imposto suportado a montante.
Tendo em vista a clarificação das alterações introduzidas, procede-se à divulgação das presentes instruções:
Âmbito da isenção
De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, estão temporariamente isentas do imposto as importações e transmissões dos bens alimentares ali elencados.
Os referidos bens beneficiam da isenção temporária do imposto, com direito a dedução a montante, nas mesmas condições em que beneficiariam das taxas reduzidas, aplicando-se, com as devidas adaptações, a doutrina administrativa que vem sendo adotada na interpretação das verbas constantes das listas anexas ao Código do IVA.
Dado o requisito da neutralidade do imposto e o disposto no n.º 1 do artigo 15.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias, deve entender-se que a isenção agora consagrada se aplica em todo o circuito comercial, incluindo nas aquisições intracomunitárias dos referidos bens.
Alguns esclarecimentos sobre o enquadramento dos produtos alimentares abrangidos pela isenção
Cereais e derivados, tubérculos
- Pão;
- A isenção abrange os produtos comercializados com a designação de “Pão” dos tipos elencados no artigo 3.º da Portaria n.º 52/2015, de 26 de fevereiro, a qual fixa as características a que devem obedecer os diferentes tipos de pão e de produtos afins do pão ou de padaria fina, regulando aspetos da sua comercialização.
- o pão ralado;
- os produtos afins do pão ou de padaria fina;
- produtos intermédios ou em processo de fabrico, designadamente, o “Pão pré-cozido congelado”, a “massa de Pão congelada” ou “outras massas semielaboradas”.
- Batata em estado natural, fresca ou refrigerada;
- Abrange qualquer tipo de batata (branca, roxa, doce, etc.), fresca ou refrigerada, descascada, inteira ou cortada.
- Não beneficia da isenção a batata seca ou desidratada, ou a congelada, ainda que previamente cozida.
- Massas alimentícias e pastas secas similares, excluindo massas recheadas;
- Abrange as massas alimentícias frescas ou secas, com exceção das que sejam recheadas ou com molhos incluídos.
- Arroz (em película, branqueado, polido, glaciado, estufado, convertido em trincas);
- Não abrange, por exemplo, o arroz fumado ou aromatizado.
- Legumes e produtos hortícolas frescos ou refrigerados, secos, desidratados ou congelados, ainda que previamente cozidos
- Cebola;
- Tomate;
- Couve-flor;
- Alface;
- Brócolos;
- Cenoura;
- Courgette;
- Alho Francês;
- Abóbora;
- Grelos;
- Couve portuguesa;
- Espinafres;
- Nabo;
- Ervilhas;
- Admite-se a apresentação destes produtos no estado de cortados ou partidos.
- Excluem-se as conservas, caldas ou polpas de legumes ou produtos hortícolas (Ex. Pickles).
- Maçã;
- Banana;
- Laranja;
- Pera;
- Melão;
- Admite-se o corte da fruta.
- Feijão vermelho;
- Feijão frade;
- Grão-de-bico;
- Excluem-se as conservas de leguminosas.
O Regulamento n.º 1308/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, define o conceito de “produtos lácteos” como os “produtos derivados exclusivamente do leite, considerando-se que lhe podem ser adicionadas as substâncias necessárias ao fabrico de cada produto, desde que tais substâncias não sejam utilizadas para substituir, total ou parcialmente, qualquer componente do leite”.
- Leite de vaca em natureza, esterilizado, pasteurizado, ultrapasteurizado, fermentado ou em pó;
- Excluem-se da aplicação da isenção: o leite concentrado, evaporado, condensado, em blocos ou granulado; as natas; os leites chocolatados, aromatizados, vitaminados ou enriquecidos.
- São, ainda, excluídos outros tipos de leite, ainda que a sua composição possa integrar leite de vaca, bem como as bebidas lácteas.
- Iogurtes ou leites fermentados;
- Produtos lácteos regulados pela Portaria n.º 742/92, de 24 de julho. Beneficiam da isenção os iogurtes ou leites fermentados naturais, aromatizados ou com pedaços.
- Queijos;
- A isenção abrange qualquer tipo de queijo que integre o conceito de produto lácteo.
- Porco;
- Frango;
- Peru;
- Vaca;
- Exclui-se a carne e miudezas comestíveis de qualquer outra espécie de animal.
- A isenção também não abrange as conservas ou preparados de carne, os quais se encontram sujeitos a IVA à taxa normal (23%).
- Bacalhau;
- Sardinha;
- Pescada;
- Carapau;
- Dourada;
- Cavala.
- A isenção abrange exclusivamente as espécies indicadas, nos estados admitidos, excluindo espécies afins (Ex. Paloco ou escamudo).
- É excluído o peixe fumado de qualquer espécie bem como as conservas de peixe, exceto de atum, nos termos do item seguinte.
A isenção abrange apenas as conservas de atum (Ex. em água, em azeite ou em óleo).
Ovos de galinha, frescos, secos ou conservados
Apenas os ovos de galinha beneficiam da isenção.
Não abrange partes de ovo, derivados do ovo ou ovos confecionados (Ex. clara pasteurizada, ovo cozido, etc.).
Gorduras e óleos
- Azeite;
- Atendendo ao objeto do diploma, a isenção apenas abrange o azeite para consumo.
- Beneficiam da isenção os produtos com a denominação legal de “azeite virgem extra”, “azeite virgem” ou “azeite – composto por azeite refinado e azeite virgem”.
- Óleos vegetais diretamente comestíveis e suas misturas (óleos alimentares);
- «Óleo alimentar» é a mistura de dois ou mais óleos dos referidos no n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 106/2005, de 29 de junho, refinados isoladamente ou em conjunto, com exceção do azeite.
- Estão, assim, abrangidos pela isenção os óleos de milho, girassol, sésamo, etc.
- Manteiga.
- Matérias gordas lácteas na forma de emulsão sólida e maleável, principalmente do tipo emulsão aquosa de gordura, derivados exclusivamente do leite e/ou de certos produtos lácteos, nos quais a matéria gorda é o componente essencial; no entanto, podem ser adicionadas outras substâncias, necessárias ao seu fabrico, desde que não sejam utilizadas como substitutos, totais ou parciais, de algum componente do leite.
- Podem ser usados os termos “meio-gordo”, “magro” ou “light”, consoante o limite mínimo e máximo de matéria gorda láctea.
- A isenção não abrange, por exemplo, manteiga de amendoim ou manteiga de cacau.
Tendo este item a mesma redação da verba 1.4.9 da Lista I anexa ao Código do IVA, a caracterização dos produtos por ele abrangidos não sofre qualquer diferenciação.
Neste sentido, a aplicação da isenção a estes produtos segue o critério para aplicação da taxa reduzida estabelecido no Ofício-Circulado n.º 30254, de 5 de janeiro de 2023.
Produtos dietéticos destinados à nutrição entérica e produtos sem glúten para doentes celíacos
A alimentação entérica, também conhecida por alimentação por sonda, é uma forma de proporcionar nutrição, ou alimentos, diretamente ao estômago ou intestino delgado. Para que os produtos dietéticos destinados a este tipo de alimentação possam beneficiar da isenção, deve tomar-se em consideração o disposto no Decreto-Lei n.º 74/2010, de 21 de junho, relativa a géneros alimentícios destinados a uma alimentação especial.
Beneficiam, também, da isenção os géneros alimentícios que se encontrem especialmente produzidos, preparados ou transformados de forma a responder às necessidades dietéticas especiais das pessoas com intolerância ao glúten, ficando afastados da mesma os que na sua composição original não contenham glúten, ainda que a respetiva rotulagem faça alusão à sua ausência.
Facto gerador e exigibilidade
De acordo com o disposto no n.º 9 do artigo 18.º do Código do IVA, a taxa aplicável é a que vigora no momento em que o imposto se torna exigível, em conformidade com os artigos 7.º e 8.º e em conjugação com o n.º 1 do artigo 36.º, o qual estabelece os prazos para emissão da fatura. Deve ter-se em conta, também, no que se refere às aquisições intracomunitárias, o momento da exigibilidade do imposto previsto nos artigos 12.º e 13.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias.
Nas operações em que o facto gerador do imposto é concomitante com o momento da exigibilidade ou, naquelas em que o momento do pagamento, ainda que parcial, ocorre em antecipação à realização da operação, as taxas a aplicar são as que vigoram nesse momento.
Assim, se o momento da exigibilidade – pagamento antecipado, ainda que parcial ou emissão da fatura no momento da realização da operação – ocorreu até 17 de abril de 2023 (inclusive), aplica-se a taxa em vigor naquele momento; se o referido facto ocorreu a partir de 18 de abril de 2023 (inclusive), aplica-se a isenção prevista na Lei n.º 17/2023, de 14 de abril.
Para as restantes situações, em que o facto gerador e a exigibilidade não são coincidentes, interessa apresentar alguns exemplos:
- Nas transmissões de bens efetuadas entre 11.04.2023 e 17.04.2023, em que o prazo previsto no n.º 1 do artigo 36.º do Código, para a emissão da fatura, foi respeitado, tendo esta sido emitida até 17.04.2023 (inclusive), aplica-se a taxa em vigor naquela data.
- Nas transmissões de bens efetuadas entre 11.04.2023 e 17.04.2023, em que o prazo previsto no n.º 1 do artigo 36.º do Código, para a emissão da fatura, foi respeitado, tendo esta sido emitida após 17.04.2023, aplica-se a isenção prevista na Lei n.º 17/2023, de 14 de abril.
- Nas transmissões de bens ou prestações de serviços efetuadas antes de 11.04.2023, em que o prazo previsto no n.º 1 do artigo 36.º do Código, para a emissão da fatura, não foi respeitado e esta tenha sido emitida após 17.04.2023, aplica-se a taxa correspondente ao produto transacionado em vigor naquela data, sem prejuízo da aplicação da coima e de juros compensatórios que se mostrem eventualmente devidos. Com efeito, a exigibilidade do imposto já se havia verificado antes da entrada em vigor da norma de isenção.
- Assim, tendo sido emitida fatura a partir de 18.04.2023 (inclusive), em que foi respeitado o prazo para a sua emissão, mas em que, em momento anterior à referida data, ocorreu o pagamento parcial ou total do preço da operação, com a correspondente emissão de fatura e sobre o qual incidiu a taxa do imposto, é aplicável a isenção prevista na Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, à eventual diferença entre o referido pagamento e o preço total, devidamente evidenciada na fatura.
- Tratando-se de fatura emitida em data anterior a 18.04.2023, ainda que se esteja perante uma situação de faturação antecipada relativa a operação que ocorre após esta data, aplica-se a taxa em vigor na data em que a fatura foi emitida.
Nas regularizações previstas nos n.ºs 2 e 3 do artigo 78.º do Código do IVA, em que haja lugar à anulação ou à redução do valor tributável de uma operação sobre a qual tenha sido liquidado imposto, o correspondente documento retificativo, a que se refere o n.º 7 do artigo 29.º do referido Código, deve refletir a taxa aplicada, independentemente da data em que ocorra a regularização, sendo o respetivo valor inscrito na declaração correspondente ao período de imposto em que a mesma se verifique.
Quando, na sequência de revisão do preço fixado ou de inexatidão cometida na fatura, resulte imposto a favor do Estado, o documento retificativo da fatura com vista à regularização deve, ainda que emitido após 17.04.2023, fazer referência à taxa utilizada na fatura objeto de correção, quando a exigibilidade do imposto relativo à operação tenha ocorrido até àquela data (inclusive). Esta regularização é obrigatória, podendo ser feita sem qualquer penalidade até ao final do período de imposto seguinte àquele a que respeita a fatura a retificar.
Caso não seja efetuada no prazo previsto, a regularização continua a ser obrigatória e deve ter lugar em declaração de substituição do período em que deveria ter sido efetuada.
Nas situações descritas anteriormente, sempre que o documento retificativo seja emitido após 17.04.2023, deve nele constar, de forma expressa, a identificação da fatura e a data a que respeita a regularização, bem como, se for caso disso, a data em que o imposto se tornou devido, nos termos do artigo 7.º do Código do IVA.
Direito à dedução
Ao incluir, no artigo 2.º, n.º 2, uma norma sobre o exercício do direito à dedução, a Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, pretende assegurar que os sujeitos passivos que efetuem transmissões de bens isentas nos termos do n.º 1, podem deduzir o imposto suportado nas aquisições de bens e serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo com vista à sua realização.
Formalidades da fatura
As faturas que titulem as transmissões de bens isentas nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, devem fazer menção a esta norma legal como motivo justificativo da não liquidação do imposto1,2 (Exemplo: “IVA – Isenção prevista na Lei n.º 17/2023, de 14 de abril”, ou semelhante).
Preenchimento da declaração periódica do IVA
As operações relativas aos produtos alimentares abrangidos pela isenção prevista na Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, devem ser relevadas na declaração periódica do IVA mediante inscrição:
- Transmissões de bens – Campo 8 do Quadro 06;
- Aquisições intracomunitárias de bens – Campo 14 do Quadro 06;
- Importações de bens3 – Campo 18 do Quadro 06.
Para efeitos da obrigação de comunicação dos elementos das faturas prevista no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 198/2012, de 24 de agosto, deve ser utilizado o código de isenção:
M26 - Isenção de IVA com direito à dedução no cabaz alimentar
Produção de efeitos
Conforme resulta do artigo 3.º da Lei n.º 17/2023, de 14 de abril, a isenção prevista no artigo 2.º é aplicável às operações a que se refere o presente ofício-circulado, durante o período compreendido entre 18 de abril e 31 de outubro de 2023.
__________
1. Em cumprimento do disposto na alínea e) do n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA.
2. Sem prejuízo dos restantes requisitos previstos no artigo 36.º do Código do IVA.
3. Quando o sujeito passivo tenha optado pelo pagamento do imposto devido pela importação de bens na declaração periódica – Cf. n.ºs 8 e 9 do artigo 27.º do Código do IVA.
(in Boletim do Contribuinte, 2023, nº 9, 1ª quinzena de maio, págs. 333 a 336)
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