Vinhos de Lisboa procuram o seu caminho na diversidade ;

Vinhos de Lisboa procuram o seu caminho na diversidade
A conferência ficou marcada pela atribuição do estatuto de Cidade Europeia do Vinho 2018 à candidatura conjunta de Torres Vedras e Alenquer.
Diversidade, notoriedade, certificação. Como conciliar a aposta nas castas internacionais quando as tendências ditam o uso de castas autóctones? Como tirar partido da incrível diversidade de denominações de origem? Como transformar volume em valor? Estes foram alguns dos temas debatidos na conferência «Vinhos de Lisboa: os Desafios do Crescimento», promovida pela Vida Económica.

A região vitícola de Lisboa atravessa atualmente uma dinâmica de “concentração excessivamente perigosa”, em que “um pequeno número de produtores” representa a maior fatia de produção de vinhos certificados. Segundo José Luís Oliveira Silva, da Casa Santos Lima, ela própria a maior produtora de vinhos da região, este enviesamento “significa menos agentes económicos a promover a região no estrangeiro”.
No decurso da mesa-redonda da Conferência de Viticultura – «Vinhos de Lisboa: os Desafios do Crescimento», promovida pela Vida Económica, que teve lugar no Auditório dos Paços do Concelho de Torres Vedras, Paulo Tavares da Silva, da Quinta da Chocapalha, referiu que a “notoriedade depende sobretudo dos grandes agentes económicos”. Na sua opinião, “há uma grande tendência para o individualismo”, pelo que os operadores devem “aprender a jogar em conjunto”.
A mesma opinião manifestou João Vieira, da Quinta de S. Sebastião. “Todos os posicionamentos são válidos”, sendo que diferenciação é “a oportunidade de realçar o que nos torna diferentes”. A estratégia da sua empresa passa por ajustar “as marcas e vinhos à procura dos mercados internacionais, sem perder identidade; no mercado interno, somos concorrentes, no mercado externo somos parceiros e cooperantes”.
Até porque, como sublinhou Francisco Bento dos Santos, da Quinta Monte d’Oiro, “ainda estamos na fase inicial de levar os nomes Portugal e Lisboa ao exterior”. Para este responsável, a “alteração da legislação” que levou à mudança de designação regional (de Estremadura para Lisboa) “foi positiva, pois aproximou-nos de um nome e de uma marca com peso”.
Entre as mais-valias competitivas da região contam-se a diversidade de “terroirs”, castas e perfis de vinhos. Como havia frisado Vasco d’Avillez, presidente da Comissão Vitivinícola da Região de Lisboa, no arranque da sessão, Lisboa é uma “região extensa mas muito diversa, abrangendo nove denominações de origem e dois tipos de IGP: o Regional Lisboa e o Regional Lisboa Leve”.
As DO apresentam características muito interessantes pois, se três deles são “históricas”, como Encostas d’Aire, Colares e Carcavelos, outros, como Lourinhã, são muito raros por serem unicamente demarcados para aguardente, e outros ainda, como Bucelas, “unicamente demarcado para uvas brancas Arinto.
Entre estas DO conta-se Colares. Para José Vicente Paulo, da Adega Regional de Colares, “somos um pequeno produtor, que aposta sobretudo em castas autóctones”. Grande parte das vendas “é feita diretamente ao cliente na adega, pelo que atingimos um preço médio de 12 euros/litro e, nos vinhos DOC, a 25 euros/litro”.
Sobre a dicotomia castas autóctones vs. castas internacionais, Paulo Tavares da Silva dá conta que as “castas estrangeiras são preferidas em Portugal e as castas nacionais são preferidas no estrangeiro”. O enólogo José Neiva Correia, da DFJ Vinhos, remata: “O trabalho do enólogo e das empresas é fazer os vinhos que o consumidor quer. É mais fácil do que tentar convencê-lo a comprar o que nós queremos fazer”.

Cidade Europeia do Vinho 2018
 
A conferência ficou marcada pela atribuição do estatuto de Cidade Europeia do Vinho 2018 à candidatura conjunta de Torres Vedras e Alenquer, que certificam anualmente cerca de 215 e 900 mil selos, respetivamente. Carlos Bernardes, presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, frisou que este será “o ano zero para a alavancagem e ampliação da relação do território com o setor dos vinhos, com a comunidade científica e do conhecimento”.
Por sua vez, Pedro Folgado, presidente da Câmara Municipal de Alenquer, sustentou que a região apresenta “séculos de história intermunicipal”, não sendo “uma região balizada”. A Cidade Europeia do Vinho 2018 é considerada “importante pelas atividades relacionadas com a candidatura, mas também pelo impacto e notoriedade que trará à região”.
Sendo uma das maiores produtoras nacionais em volume, a região de Lisboa passou, em sete anos, de 16 milhões para 40,5 milhões de garrafas certificadas, um aumento de 15% ao ano. Este refletiu-se ainda na melhoria contínua do preço médio de venda por litro, culminando no aumento de 6% entre 2016 e 2017. Segundo Vasco D’Avillez, há ainda uma grande margem para progredir na certificação, uma vez que muitos produtores, sobretudo adegas, optam por não o fazer, apesar de os vinhos terem qualidade para tal. Verifica-se “uma grande diferença entre o volume do regional, com 39 milhões de selos, e os DOC, com 1,5 milhões”.
Vasco d’Avillez deu ainda conta que a região está a aprofundar o segmento do enoturismo, num trabalho de ligação com as Rotas dos Vinhos de Lisboa, e que o simpósio trienal que as regiões Tejo, Setúbal e Lisboa organizam com a Sociedade de Ciências Agrárias de Portugal será feito em 2018 ,nas cidades de Alenquer e de Torres Vedras.

Diversidade e atitude

Diversidade de oferta em várias gamas, melhoria do preço médio e maior acompanhamento dos produtores junto dos seus clientes. Estes são alguns dos pontos que Jorge Monteiro, presidente da ViniPortugal, elencou como sendo vitais para a melhoria da competitividade do setor vitivinícola nacional.
Portugal representa 1% da quota de exportação da produção mundial, é o 11º produtor mundial e tem em preço médio de venda de exportação um euro superior ao espanhol (considerando o vinho do Porto), sendo o 7º melhor preço médio (3,51 dólares/litro) e o 8º no valor global de exportações de vinhos, com 747 milhões de dólares.
Para Jorge Monteiro, o setor deve ser capaz de “adaptar a oferta às expectativas dos mercados” e melhorar “a competitividade dos preços de custo”. Por outro lado, é necessário “construir marcas, origens ou castas, com forte notoriedade, no mercado mundial”.
E se Portugal é o terceiro país do mundo com maior número de castas autóctones e ocupa um lugar cimeiro na diversidade genética por área de superfície, apenas 34 castas representam 89% do total da vinha, predominando 18 tintas, das quais duas internacionais (61% de área); e 16 brancas, todas nacionais (28% de área), sublinhou Maria João Fernão-Pires, do IVV.
Também a diversidade de oferta foi elencada, a qual deve incluir tipos de vinhos (brancos, tintos, rosados), o segmento (popular, entrada, premium e superpremium) e de regiões. “Mas é igualmente necessário conhecer os mercados e as preferências dos consumidores”, valorizar aspectos relacionados com a saúde (em mercados como chinês), embalagem (BIB na Noruega), acidez vs., açúcar (Polónia) ou o estado da economia dos mercados (Angola e Brasil)”, reforçou Jorge Monteiro.
Por outro lado, “não assentar a competitividade nos preços baixos, mas trabalhar para melhorar a competitividade dos custos”, ou seja, “o rendimento por hectare e custos de produção por hectare”. Mesmo “a vender mais caro que Chile, Espanha e África do Sul, não significa que ganhemos mais”, sublinhou. Portugal apresenta um rácio de preço por hectare inferior a praticamente todos os países do chamado Novo Mundo, bem como Espanha e Itália. Jorge Monteiro frisou que os operadores devem mudar de atitude, desde logo no aperfeiçoamento de técnicas de comunicação, marketing e vendas, bem como no acompanhamento do cliente.
No mesmo sentido foi a opinião do enólogo António Ventura, para quem Portugal tem a necessidade de acrescentar valor ao seu preço médio e vinhos diferenciadores podem ajudar. “Vinhos fáceis e baratos”, “comerciais e tecnológicos”, “vinhos Premium de elevado valor” e “vinhos de nicho diferenciadores”, “que estilos de vinhos fazer para conquistar mercados?”, questionou. “A resposta costuma ser: todos, porque cada um terá o seu mercado”.
Portugal e a região de Lisboa, em particular, “possuem um conhecimento secular e a capacidade inquestionável para produzir vinhos mais ou menos consensuais, mas sobretudo diferenciadores”, afirmou António Ventura. “Esta diversidade e capacidade de fazer diferente constitui o nosso melhor trunfo competitivo cá dentro e lá fora”, mostrando-se convicto que “os resultados futuros falarão por si”.
Marc Barros marcbarros@vidaeconomica.pt, 08/02/2018
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