Sabotagem – Como o meu pai resolveu um conflito na sua empresa;

Prevenção e Mediação de Conflitos
Sabotagem – Como o meu pai resolveu um conflito na sua empresa
“Queres saber quantas queixas apresentei em tribunal durante a minha vida profissional?” perguntou-me o meu pai com ar vitorioso na minha última visita. Já conhecia a resposta perfeitamente, mas entrei no jogo para ver o meu pai feliz: “Quantas?” Como sempre, ele encheu o peito e respondeu cheio de orgulho: “Nenhuma. Nunca iniciei um processo jurídico, sempre consegui negociar um compromisso e encontrar uma solução. Às vezes era necessário ameaçar ir pelo caminho jurídico, mas, afinal, ninguém queria perder tempo, dinheiro e eventualmente penalizar a sua imagem.»
O meu pai, hoje de 82 anos, foi sócio-gerente de uma fábrica têxtil. A fábrica deu trabalho a 100 pessoas que produziram fios para alcatifas e tapetes de diversas indústrias, como automóvel e têxtil. Lembro-me de diversos conflitos sobre os quais o meu pai fez relatos completos na mesa de jantar. Conflitos com funcionários, fornecedores, parceiros e clientes. O caso que mais me fascinou, entre os vários casos interessantes, foi uma história cujo desenvolvimento me manteve em suspense durante vários dias aos meus 13 ou 14 anos. Mal podia esperar pelo jantar. Uma vez, o meu pai e o outro sócio-gerente encontraram fios com tinta vermelha. Toda a produção dessa linha era “lixo”, uma “perda gigantesca de centenas de milhares de marcos”, o meu pai estava furioso. Preocupadíssimos, os sócios dedicaram-se à rápida análise das possíveis causas, indo por exclusão de partes, até que o meu pai no, talvez, terceiro jantar formulou uma bombástica suspeita: “Sabotagem!” A seguir, foi à fábrica porque o colaborador suspeito ia trabalhar no turno noturno. Apanhou-o em flagrante: a estragar a produção, a prejudicar a empresa. E depois?
Depois fez uma coisa que ninguém na mesa de jantar esperava: nem a minha mãe, nem a minha irmã, nem eu. O meu pai chamou o colaborador ao seu gabinete. Convidou-o para se sentar num dos sofás, onde costumava receber os clientes, pediu café e bolachas à assistente e, com calma e empatia, iniciou a conversa. Pouco a pouco soube os motivos do senhor: veio tudo junto, a situação familiar, a frustração no trabalho e a falta de atenção e reconhecimento. A conversar, encontraram uma solução para continuar a colaborar e ficaram ambos a ganhar: O senhor recebeu uma segunda oportunidade e o meu pai ganhou um colaborador motivado e dedicado. Os dois conseguiram restabelecer a paz, com impacto positivo no clima de trabalho. Uma guerra jurídica teria contaminado os colegas com efeitos imprevisíveis no bem-estar e na produtividade.
Que grande mediação que o meu pai fez. Criou o ambiente, estabeleceu igualdade dentro do possível, tratou o senhor com respeito e colocou o foco no futuro. Imagine como a conversa teria decorrido com o meu pai no seu cadeirão atrás da sua secretária e o colaborador numa cadeira à frente. Sem café, sem bolachas, mas com perguntas inquisitórias. Na mediação, temos os mesmos elementos: o tratamento igual e respeitoso das pessoas em conflito, a criação de uma atmosfera descontraída, um arranjo lateral de lugares para evitar o confronto direto e – muito importante – a confidencialidade. Foi crucial o meu pai ter falado a sós com o colaborador, sem o seu sócio, pela confidencialidade e também pelo desequilíbrio de forças.
A mediação que praticamos hoje, com base na lei de mediação n.º 29/2013 de 19 de abril, parece-me mais rica, mais fundada e mais completa. O meu pai foi mediador e parceiro de conflito ao mesmo tempo. Esta relação de dependência, em geral, impossibilita o funcionamento de uma mediação que exige a neutralidade do mediador ou da mediadora. No caso da sabotagem do meu pai funcionou porque o colaborador devia estar a contar com tudo, menos com uma segunda oportunidade.

Silke Buss
938223762
sbuss@buss.pt
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BUSS Comunicação
Silke Buss Mediadora de Conflitos, Especialista em Comunicação, 27/01/2023
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