A 2.ª vaga da COVID-19 e a legislação laboral: lay-off/retoma progressiva “forever”? ;

A 2.ª vaga da COVID-19 e a legislação laboral: lay-off/retoma progressiva “forever”?
1.A chamada primeira vaga da pandemia, originada pela Covid-19, trouxe consigo, como é do conhecimento geral (especialmente por experiência própria de muitos de nós), uma torrente legislativa de dezenas de diplomas (do mais diverso tipo e valor jurídico) referentes a diversas áreas temáticas (“Legislação Covid”), designadamente através de um conjunto de medidas de apoio “à sustentabilidade da economia e das empresas” com particular incidência no direito do trabalho e da segurança social (ver: https://dre.pt/legislacao-covid-19-areas-tematicas#3).
 
2. Em sede de legislação laboral, muito já se escreveu sobre o lay-off simplificado e o teletrabalho: no fundo assistiu-se à modelação/flexibilização de figuras já existentes no nosso ordenamento jurídico (especialmente: Código do trabalho) em sede de organização do trabalho face ao confinamento e sequente abrandamento/paragem de vários setores da atividade económica que se assistia.
3. As referidas medidas sempre foram caracterizadas, nos respetivos preâmbulos dos instrumentos legislativos utilizados, como sendo de cariz temporário e dependentes do evoluir da situação pandémica e da económico-social – todavia, o certo é que se tarda a operacionalizar e atualizar diversas figuras constantes no Código do Trabalho, atinentes à organização do trabalho (flexibilização do tempo de trabalho, do local, etc.), cuja necessidade e utilidade vai muito para além de uma situação isolada ou temporária.
4. Sendo cada vez mais patente que estamos a passar por uma segunda vaga da pandemia, e numa altura em que se irá discutir o orçamento de Estado para 2021, volta-se a assistir a uma agitação legislativa, notadamente no que respeita às empresas e ao emprego, em que parece querer aplicar-se as anteriores fórmulas, ainda que de forma esbatida (medidas da retoma progressiva que se assemelham com uma espécie de lay-off simplificado camuflado).
5. Conforme já tivemos oportunidade de escrever em anterior artigo, “a nível de política legislativa, mais importante que preparar um novo livro branco ou verde para as relações laborais será necessário atuar rapidamente mas de forma ponderada: fazendo as escolhas que se impõem quanto ao trabalho que se quer; Deste modo, urge definir o seu quando, como e onde, harmonizando o desenvolvimento tecnológico e o crescimento económico com o bem-estar individual do trabalhador”.
6. Vem o acima referido a propósito das novas regras de concessão do apoio extraordinário à retoma das empresas, contidas no Decreto de Lei do Governo, aprovado em Conselho de Ministros em 08.10.2020 e que foi promulgado pelo Presidente da República no dia 13.10.2020, que altera o decreto-lei n.º 46-A/2020, de 30 de Julho – fazemos notar que há data em que escrevemos o presente texto, o referido diploma ainda não tinha sido publicado no Diário da República; Assim, socorremo-nos da síntese do governo (publicada na página na internet do Conselho de Ministros) quanto às referidas alterações (sublinhados e negritos nossos):
a) Reforço do apoio para manutenção de emprego às empresas em maior dificuldade: 
Ao abrigo desta alteração, as empresas com quebras de faturação iguais ou superiores a 75% podem reduzir o Período Normal de Trabalho (PNT) até 100%. Ao trabalhador é sempre garantido o mínimo de 88% da retribuição. Nestas situações, a Segurança Social assegura o pagamento de 100% da compensação retributiva, mantendo-se o regime constante do DL 46- A/2020 quanto às contribuições sociais. 
b) Apoio à manutenção de emprego nas empresas com quebras de faturação entre 25% e 40% 
O apoio à retoma progressiva passa a abranger as empresas com quebras de faturação iguais ou superiores a 25%, permitindo a redução do PNT até 33%, revendo-se o conceito de crise empresarial. 
c) Aumento dos apoios à formação dos trabalhadores 
Procede-se a um aumento do valor da bolsa para o plano de formação previsto no diploma, passando de: • €66 para €132 para o empregador • €66 para €176 para o trabalhador.
7. Faz-se notar que em termos de divulgação, nomeadamente por via dos meios de comunicação social, estas medidas de apoio à retoma para manutenção do emprego são vistas ou anunciadas como um “novo lay-off” – o que tecnicamente não é correto: sem prejuízo de a alteração mais impactante agora introduzida (possibilidade de redução total do horário dos trabalhadores) se assemelhar a uma verdadeira suspensão do contrato de trabalho.
8. O que fica dito no início deste artigo – quanto à flutuação legislativa e à necessidade de medidas de fundo e a médio/longo prazo - poderá também aplicar-se às recentes alterações, já conhecidas, em sede de teletrabalho e do estabelecimento de um regime excecional e transitório de reorganização do trabalho e de minimização de riscos de transmissão da infeção da doença COVID-19 no âmbito das relações laborais (aplicável às empresas com locais de trabalho com 50 ou mais trabalhadores, nas áreas territoriais em que a situação epidemiológica o justifique).
Fernando Cardoso da Cunha Mestre em Direito das Empresas (FDUC) Advogado da Next - Gali Macedo e Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL, 15/10/2020
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