Estado exerce “bullying” sobre as empresas;

António Lúcio Batista afirma
Estado exerce “bullying” sobre as empresas
A “receita” do médico António Lúcio Batista: “Seria necessário baixar impostos e sobretudo ver o dinheiro das contribuições bem aplicado e bem explicado”.
A pressão repetitiva e continuada da Autoridade Tributária atua como “bullying”, levando pequenos empresários a situações de ansiedade permanente, quadros obsessivos e até à desistência – afirma António Lúcio Batista, responsável pela saúde no Portugal 2040 da Iniciativa Liberal. Um mal que, em seu entender, não é fácil de tratar “porque seria necessário baixar impostos e sobretudo ver o dinheiro das contribuições bem aplicado e bem explicado, coisa que não tem acontecido. Como todos os dias assistimos ao oposto, torna-se difícil curar o problema”.
 
António Lúcio Batista é médico-cirurgião e cientista, empreendedor e escritor. É consultor de vários projetos envolvendo o laser-médico, robótica e inteligência artificial, em colaboração com o IPCA e a Universidade do Minho. Faz parte da equipa dos cinco finalistas a nível mundial do KUKA Innovation Award, que gera quatro patentes.
 
Vida Económica - Falou recentemente de “bullying” sobre as empresas por parte do Estado. Quer explicar-nos melhor este conceito?
António Lúcio Batista - A palavra “bullying” pode ter um significado mais lato ou mais restrito ou ainda ser uma analogia, e tem vindo a ganhar difusão nos órgãos de comunicação referindo-se às pessoas. A definição que mais me agrada é a da autoria da psicóloga Gisele Meter que o define como um fenómeno social, “uma afirmação de poder através da agressão repetitiva intencional, causando angústia, fragilizando e por aí fora”, levando muitas vezes à exaustão e à desistência.
 
VE - Como se aplica isso às empresas?
ALB - Baseado na minha experiência pessoal e na atitude de intervenção cívica, escrevi há tempos no “Público” um pequeno artigo de opinião intitulado “Hipertensão fiscal”. Essa história do mês do coração baseava-se num pequeno empresário que começou a sofrer de hipertensão arterial sem qualquer outra causa que não o stress de receber permanentemente cartas da Agência Tributária, tendo evoluído para situações de pânico. Voltei agora à carga com uns exemplos que fui estudando durante quatro anos, observando na consulta pequenos e médios empresários que vivem asfixiados com impostos, taxas e “taxinhas” de todo o tipo. Esta pressão repetitiva e continuada atua como “bullying”, levando estes pequenos empresários a situações de ansiedade permanente, quadros obsessivos e até à desistência.
 
VE - Penso que compreendo que se trata de uma analogia. Este problema tem solução?
ALB - O tratamento não é fácil porque seria necessário baixar impostos e sobretudo ver o dinheiro das contribuições bem aplicado e bem explicado, coisa que não tem acontecido. Como todos os dias assistimos ao oposto, torna-se difícil curar o problema.
 
VE - Tem muitas vezes dito que Portugal é um país de brincadeira. Porque faz esta afirmação?
ALB - Essa frase não é minha e tem sido atribuída a António Champalimaud, quando foi viver para o Brasil. Mas na realidade é o que sinto, é um desabafo. Muitos cidadãos sentem o mesmo. Temos um país pequeno (“small is beautiful”), um local privilegiado (costa ocidental da Europa), com um bom clima e pessoas simpáticas, poderíamos ser um dos melhores países do mundo, mas temos tido azar com os governantes.
 
VE - É um problema de qualidade das pessoas que nos têm governado?
ALB - Penso que sim. Uns eram pessoas corretas, mas fracos nos seus cargos, outros eram corruptos e juntaram uma legião de seguidores e oportunistas.
Políticos não têm “visão de futuro”
 
VE - Está preocupado com o futuro do país?
ALB - O futuro é agora! Estou preocupado com o futuro dos meus filhos e netos. Anda tudo enganado com o socialismo, estão a discutir temas do século passado e não os do futuro. Em Portugal os políticos não têm “visão de futuro” como diz Daniel Innerarity ou José Gil. Os jovens que são brilhantes e desenvolvem projetos inovadores ficam exaustos com as dificuldades e acabam por vender as suas patentes ou os projetos a outros países, perdendo Portugal a possibilidade de criar mais-valias e riqueza. É uma pena.
 
VE - O que se pode fazer para mudar?
ALB - É muito difícil porque o país está “armadilhado”. A mudança cultural necessária levaria duas legislaturas no mínimo e a trabalhar a grande velocidade. Necessitamos de abanar isto. Penso que seria necessário um governo de nórdicos ou de tipo nórdico durante duas legislaturas e depois passar a gerações mais novas, despoluídas dos atuais vícios. Isto no aspeto político. No aspeto económico, necessitaríamos de mais liberdade e concorrência para as empresas que têm qualidade para se desenvolverem. Em algumas áreas, como na saúde, o Estado é praticamente o único e grande cliente, os concursos são o que são, às vezes só para amigos.       
 
VE - E estas empresas não podem concorrer com outros países da União? 
ALB - Poder, podem, mas há dificuldades pela escala e também tecnológicas. Vejamos o caso da indústria 4.0 e a construção. Percebi por uma palestra que não estamos nas mesmas plataformas.
 
VE - Pelo vistos, isto está difícil de resolver.
ALB - Sim, deram um nó cego. Necessitamos de um choque emocional e cultural. Por exemplo, o tal governo tipo nórdico durante algum tempo. 
 
Amiguismo político bloqueia iniciativa dos jovens
 
VE - Isso não seria mais ou menos o mesmo que a “troika?”
ALB - Não gosto desse nome e não quero voltar a pensar nisso. Acredito mais em jovens ou menos jovens que tiveram experiência lá fora, noutros países mais avançados e que têm cérebros brilhantes, mas que, no entanto, têm sido bloqueados pelos tais amiguismos e “familiarismos”.
 
VE - Foi por isto que decidiu aderir à Iniciativa Liberal?
ALB - A Iniciativa Liberal é uma lufada de ar fresco e eu estava com falta de ar. Estou a ajudar no Portugal 2040 na área da saúde e vamos apresentar propostas inovadoras. Demora algum tempo para que as pessoas assimilem o que estamos a propor, há uma grande resistência à mudança, mas os ingredientes estão lá. Há insatisfação quanto baste (I) e vontade de mudar (V). É necessário dar dois passos para votar liberar (2P), para vencer a resistência (R), que é grande.
 
VE - Então daí a “fórmula mágica” para a mudança que tem apresentado em conferências?
ALB - Sim, os engenheiros gostam de fórmulas, bem como os físicos, químicos, biólogos, geneticistas e agora os médicos vão ter de gostar também. A inteligência artificial e a robótica estão aí e, isso sim, é para o século XXI. 
 
VE - Explique-nos então a “fórmula mágica”.
ALB - “(I x V) + 2P > R”, é necessário multiplicar a insatisfação pela vontade de mudar e dar dois passos para a urna de voto e votar liberar. Só assim se vencerá o imobilismo e a mediocridade. Estamos a perder em todas as frentes, poderíamos ser um Silicon Valley, por um lado, e um paraíso turístico e cultural, por outro, e todos sabemos disso. Os melhores têm-se afastado e são abstencionistas. Abrir a TV e ver duas notícias de futebol e culinária seguido de telenovelas é frustrante. É uma pena, Portugal assim é mesmo um país de brincadeira (frase atribuída a António Champalimaud).
 
Susana Almeida, 23/05/2019
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