Benefícios e incentivos fiscais apenas devem ser mantidos se tiverem resultados económicos ou sociais comprovados
Algumas das medidas consagradas no Estatuto dos Benefícios Fiscais e noutros diplomas de benefícios e incentivos fiscais têm provocado um aumento da nossa competitividade, mas também da desigualdade, a par de outros esforços avulsos tendentes a tornar a justiça tributária mais célere ou a conferir maior estabilidade e simplificação ao sistema fiscal, que escasseiam. Mas representam também despesa tributária cessante efetiva, a qual, a ser reavaliada, pode permitir, com manutenção da receita fiscal e do défice, mesmo a diminuição dos impostos e da carga tributária. Rogério Fernandes Ferreira, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em entrevista à “Contabilidade & Empresas”, comentou a atual situação dos benefícios fiscais, designadamente o papel que cumprem no ordenamento jurídico, o seu contributo para o crescimento económico e como deverão ser abordadas futuras revisões.
Contabilidade & Empresas – Como contextualiza os benefícios fiscais, na atual conjuntura?
Rogério Fernandes Ferreira – Os benefícios fiscais representam derrogações ou exceções às regras gerais de tributação, uma vez que suspendem, ainda que temporariamente, a aplicxação dos princípios da igualdade tributária e da capacidade contributiva, pelo que devem ter sempre em vista a prossecução de interesses extrafiscais constitucionalmente relevantes. Em virtude do caráter excecional dos benefícios fiscais, o legislador prevê mesmo a obrigatoriedade de reavaliações periódicas, tendo em vista verificar o seu custo-benefício e a atualidade dos pressupostos que anteriormente levaram à sua criação ou manutenção, ou seja, dos interesses, públicos e extrafiscais, que visam promover e que os motivaram.
C&E – Na sua opinião, os referidos benefícios fiscais representam um contributo importante para o desenvolvimento económico do país?
RFF – Importa referir que os benefícios e os regimes previstos no Estatuto dos Benefícios Fiscais e noutros diplomas se têm revelado instrumentais para o crescimento do investimento em Portugal. A título de exemplo, o regime de tributação dos organismos de investimento coletivo ou outro exemplo a criação, tão vilipendiada por alguns, da Zona Franca da Madeira tem tido um papel importante na nossa comunicação fiscal internacional e no incremento do perfil do nosso país enquanto pólo de investimento estrangeiro, com particular foco até nos recursos marítimos e na economia do mar. Numa perspetiva mais interna, é de salientar, noutro exemplo, o contributo à inovação que foi trazido, por exemplo, pelo regime de tributação dos fundos de capital de risco, que tem incentivado os investidores a apostarem nas “start-ups” e pequenas e médias empresas, as quais correspondem à maioria do tecido empresarial.
Investimento nas empresas
C&E – E quanto ao investimento nas empresas, por via de benefícios fiscais?
RFF – O investimento nas empresas com o recurso a capitais próprios tem sido também importante, com a consagração de benefícios, como a remuneração convencional do capital social, em que se prevê a dedução, em cada exercício, de uma taxa de 7% sobre o montante das entradas de capital realizadas com recurso aos lucros do próprio exercício, embora também em dinheiro ou por conversão de créditos, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do seu capital social. No que se refere às PME, há o próprio regime do Código do IRC, que prevê uma taxa reduzida de 17% por referência aos primeiros 25 mil euros de lucro tributável.
C&E – Também se verifica o mesmo com as pessoas singulares?
RFF – Aqui destaco o regime de tributação especial para os residentes não habituais (RNH), o qual tem sido instrumento bem relevante para atrair para o nosso país cidadãos de elevado rendimento que desenvolvem atividades económicas e intelectualmente relevantes, como será o caso do recente fenómeno dos chamados nómadas digitais ou mesmo dos investidores em criptomoedas e noutros ativos digitais. Faço ainda notar o Código Fiscal do Investimento que prevê para as PME o benefício da dedução por lucros retidos e reinvestidos, que incentiva ao crescimento através da reaplicação dos seus lucros do exercício em ativos produtivos.
C&E – Mas não haverá a necessidade de reavaliar e tomar decisões quanto à manutenção ou eliminação de alguns benefícios fiscais?
RFF – Em virtude da obrigatoriedade da reavaliação dos benefícios fiscais vigentes no Estatuto dos Beneficios Fiscais, importaria que fossem mantidos apenas os regimes que têm, efetivamente, apresentado resultados do ponto de vista económico e social e que podem, de facto, contribuir para o crescimento económico do país, especialmente nesta fase de recuperação pós-pandémica. Esta reavaliação deve ser feita com objetividade e neutralidade e nunca – como pode suceder – numa perspetiva de aumento da receita, devendo ser efetivamente ponderado o impacto económico dos regimes e as implicações, com o intuito, mesmo, de diminuir a carga fiscal global.
C&E – Como pode ser realizada essa reavaliação?
RFF – Uma reavaliação geral dos benefícios e incentivos fiscais atualmente existentes, com base, por exemplo, em relatórios vários que foram sendo elaborados no seio de comissões como as coordenadas por Paulo de Pitta e Cunha, no final da década de oitenta, por Manuel Freitas Pereira, na década de noventa, por Luís Máximo Santos, no início deste século ou, mais recentemente, por Francisca Guedes de Oliveira, permitiria eliminar muitos daqueles benefícios e incentivos tributários que não tenham real justificação económica e social e que, nesta medida, não cumprem os objetivos extrafiscais para que foram constituídos. Esta reavaliação permitiria o alargamento da base tributável e mesmo a diminuição das taxas de imposto e dos encargos fiscais.
Rogério Fernandes Ferreira – Os benefícios fiscais representam derrogações ou exceções às regras gerais de tributação, uma vez que suspendem, ainda que temporariamente, a aplicxação dos princípios da igualdade tributária e da capacidade contributiva, pelo que devem ter sempre em vista a prossecução de interesses extrafiscais constitucionalmente relevantes. Em virtude do caráter excecional dos benefícios fiscais, o legislador prevê mesmo a obrigatoriedade de reavaliações periódicas, tendo em vista verificar o seu custo-benefício e a atualidade dos pressupostos que anteriormente levaram à sua criação ou manutenção, ou seja, dos interesses, públicos e extrafiscais, que visam promover e que os motivaram.
C&E – Na sua opinião, os referidos benefícios fiscais representam um contributo importante para o desenvolvimento económico do país?
RFF – Importa referir que os benefícios e os regimes previstos no Estatuto dos Benefícios Fiscais e noutros diplomas se têm revelado instrumentais para o crescimento do investimento em Portugal. A título de exemplo, o regime de tributação dos organismos de investimento coletivo ou outro exemplo a criação, tão vilipendiada por alguns, da Zona Franca da Madeira tem tido um papel importante na nossa comunicação fiscal internacional e no incremento do perfil do nosso país enquanto pólo de investimento estrangeiro, com particular foco até nos recursos marítimos e na economia do mar. Numa perspetiva mais interna, é de salientar, noutro exemplo, o contributo à inovação que foi trazido, por exemplo, pelo regime de tributação dos fundos de capital de risco, que tem incentivado os investidores a apostarem nas “start-ups” e pequenas e médias empresas, as quais correspondem à maioria do tecido empresarial.
Investimento nas empresas
C&E – E quanto ao investimento nas empresas, por via de benefícios fiscais?
RFF – O investimento nas empresas com o recurso a capitais próprios tem sido também importante, com a consagração de benefícios, como a remuneração convencional do capital social, em que se prevê a dedução, em cada exercício, de uma taxa de 7% sobre o montante das entradas de capital realizadas com recurso aos lucros do próprio exercício, embora também em dinheiro ou por conversão de créditos, no âmbito da constituição de sociedades ou do aumento do seu capital social. No que se refere às PME, há o próprio regime do Código do IRC, que prevê uma taxa reduzida de 17% por referência aos primeiros 25 mil euros de lucro tributável.
C&E – Também se verifica o mesmo com as pessoas singulares?
RFF – Aqui destaco o regime de tributação especial para os residentes não habituais (RNH), o qual tem sido instrumento bem relevante para atrair para o nosso país cidadãos de elevado rendimento que desenvolvem atividades económicas e intelectualmente relevantes, como será o caso do recente fenómeno dos chamados nómadas digitais ou mesmo dos investidores em criptomoedas e noutros ativos digitais. Faço ainda notar o Código Fiscal do Investimento que prevê para as PME o benefício da dedução por lucros retidos e reinvestidos, que incentiva ao crescimento através da reaplicação dos seus lucros do exercício em ativos produtivos.
C&E – Mas não haverá a necessidade de reavaliar e tomar decisões quanto à manutenção ou eliminação de alguns benefícios fiscais?
RFF – Em virtude da obrigatoriedade da reavaliação dos benefícios fiscais vigentes no Estatuto dos Beneficios Fiscais, importaria que fossem mantidos apenas os regimes que têm, efetivamente, apresentado resultados do ponto de vista económico e social e que podem, de facto, contribuir para o crescimento económico do país, especialmente nesta fase de recuperação pós-pandémica. Esta reavaliação deve ser feita com objetividade e neutralidade e nunca – como pode suceder – numa perspetiva de aumento da receita, devendo ser efetivamente ponderado o impacto económico dos regimes e as implicações, com o intuito, mesmo, de diminuir a carga fiscal global.
C&E – Como pode ser realizada essa reavaliação?
RFF – Uma reavaliação geral dos benefícios e incentivos fiscais atualmente existentes, com base, por exemplo, em relatórios vários que foram sendo elaborados no seio de comissões como as coordenadas por Paulo de Pitta e Cunha, no final da década de oitenta, por Manuel Freitas Pereira, na década de noventa, por Luís Máximo Santos, no início deste século ou, mais recentemente, por Francisca Guedes de Oliveira, permitiria eliminar muitos daqueles benefícios e incentivos tributários que não tenham real justificação económica e social e que, nesta medida, não cumprem os objetivos extrafiscais para que foram constituídos. Esta reavaliação permitiria o alargamento da base tributável e mesmo a diminuição das taxas de imposto e dos encargos fiscais.