Estudantes estrangeiros são uma oportunidade para a internacionalização das empresas portuguesas
“A Universidade do Porto lidera, a par de uma universidade alemã, a participação no programa Erasmus Mundus que termina este ano” – revela Bárbara Costa. Em entrevista à “Vida Económica”, a Coordenadora do serviço de Relações Internacionais da Universidade do Porto destaca o aumento constante do número de estrangeiros, que já representam 14% do total de alunos. Além do impacto direto sobre a atividade económica da cidade, a presença de alunos estrangeiros é uma oportunidade de internacionalização das empresas portuguesas. Os universitários estrangeiros criam uma relação afetiva com os produtos portugueses e muitos deles serão a curto prazo decisores nas suas áreas de atividade.
Vida Económica - O aumento do número de estudantes estrangeiros está a mudar a Universidade do Porto?
Bárbara Costa - Sem dúvida. As salas de aulas de hoje são completamente diferentes das salas de há vários anos atrás. A equipa da inovação pedagógica da Universidade tem trabalhado muito nesse processo e tem também considerado a internacionalização. Havendo estudantes estrangeiros na sala de aula, faz com que toda a dinâmica na sala também tenha de se ajustar à presença desses estudantes, seja porque parte da aula é dada em inglês ou os slides estão em inglês e o professor fala em português, seja com bibliografia adicional em língua inglesa. Aos estudantes internacionais, é-lhes permitido fazer a avaliação noutra língua, nomeadamente no inglês. Portanto, há uma necessidade também de adaptação do próprio corpo docente à nova realidade que é a internacionalização da Universidade do Porto. Quando falávamos de 500 estudantes, o impacto talvez não fosse tão visível. Neste momento, com 2800 estudantes estrangeiros, existe um impacto forte.
VE - Para os professores, o trabalho com alunos estrangeiros é um esforço acrescido?
BC - É verdade que implica um esforço adicional para o corpo docente, que teve de se adaptar a esta realidade, mas isso também traz mais-valias consideráveis. Dá uma dinâmica diferente à sala de aula ao ser possível encontrar exemplos de realidades muito diferentes da realidade portuguesa e isso enriquece também a qualidade da formação que é prestada aos estudantes, inclusive aos estudantes portugueses. A internacionalização em casa é muitas vezes conseguida pelo facto de termos cada vez mais estudantes internacionais que nos ajudam a trazer um pouco do mundo para a Universidade do Porto. Efetivamente, com a quantidade de nacionalidades que temos, rondando os 100 países, não é à toa que se refere que a Universidade do Porto tem realmente as portas abertas ao mundo.
VE - A vertente internacional é uma vocação recente que a Universidade não tinha no passado?
BC - Estou na Universidade do Porto desde 1999 e posso dizer que a aposta na internacionalização foi sempre estratégica. Acontece que, como em tudo na vida, há momentos em que as condições se reúnem para que uma determinada estratégia possa ser implementada com mais ou menos sucesso. Neste caso em particular, temos um conjunto de oportunidades disponíveis em termos de financiamento internacional, e uma estrutura da equipa reitoral que não é só de agora. Nos últimos anos as equipas reitorais foram sempre estabelecendo como prioridade estratégica a internacionalização, o que tornou possível consolidar a cooperação e construir novas colaborações com uma dinâmica muito associada à busca de financiamento internacional. É óbvio que, se não existir financiamento internacional, não é possível implementar ações de colaboração estratégica com outras universidades que são sempre parceiros relevantes. Digamos que foi um conjunto de fatores a contribuir para que a Universidade do Porto conseguisse aumentar de uma forma muito consolidada e muito visível a sua internacionalização.
VE - O financiamento internacional é mais abrangente do que as bolsas concedidas aos alunos?
BC - O financiamento é mais do que isso. Essa é a grande fatia do financiamento mas também há outros tipos de financiamento. Há o financiamento para as bolsas dos docentes, para as bolsas dos técnicos. Os dados das nossas mobilidades vão muito mais para além disso, o que ajuda a internacionalizar a universidade por dentro. Não é só o estudante que parte à descoberta de uma nova realidade, mas é também o docente que vai dar aulas lá fora e que vai perceber como é que se funciona no estrangeiro. É o técnico que sai daqui com uma ideia do que se faz num país europeu e quando regressa vem com uma ideia totalmente diferente. São experiências acumuladas que depois permitem a consolidação do processo de internacionalização.
Erasmus Mundus termina este ano
VE – A Universidade do Porto tem um grande envolvimento nos programas de financiamento?
BC - O programa Erasmus Mundus foi lançado em 2010 e termina este ano. Antes deste programa tivemos uma fase piloto com um programa que se chamava External Cooperation Window. Nós, enquanto Universidade do Porto, não tínhamos muita experiência em apresentação de projetos a candidaturas internacionais, nomeadamente a financiamento europeu.
Nós recebemos o relatório final preparado pela Comissão Europeia pela agência europeia que financia e gere o Erasmus Mundus. De acordo com o relatório, a U. Porto é, a par de uma universidade alemã, a instituição que tem mais participação no programa.
Estamos a falar de uma universidade de um país do Sul da Europa. Estes resultados talvez sejam inesperados porque somos um país periférico, um país que não tem uma dimensão muito significativa quando comparado com outros mas – que conseguiu – com muito rigor, com uma estratégia bem definida, com um esforço muito grande quer da equipa reitoral quer das faculdades, quer do serviço de relações internacionais – alcançar resultados verdadeiramente positivos. Aliás, como resultado disso, a Universidade do Porto, muito recentemente, recebeu um prémio, o “Institutional Award for Innovation in Internalisation” atribuído pelo comité executivo de uma das mais importantes, instituições de educação internacional que é a European Association for International Education (EAIE). Foi atribuído em 2016 e isto é reflexo do reconhecimento internacional do esforço levado a cabo pela Universidade do Porto e que, agora, mais uma vez, foi reconhecido no relatório final de execução do programa.
VE – Nessa vertente a Universidade do Porto concorre de forma direta com projetos de outras universidades europeias e nacionais?
BC - Sim, são apresentados projetos de universidades de toda a Europa. A participação das universidades europeias foi muito significativa. Lembro-me que, em Portugal, houve cerca de 107 participações, das quais 41 pertencem à Universidade do Porto.
VE – Para além do financiamento da Comissão Europeia, também há privados, como bancos, que também estão a financiar a mobilidade?
BC - Temos o Banco Santander, que tem ajudado a Universidade do Porto a fortalecer e consolidar a coordenação com a América Latina. Em breve teremos uma cerimónia de entrega dos certificados de participação no programa Santander Universidades aos estudantes brasileiros e da América Latina que se encontram atualmente na Universidade do Porto ao abrigo desse programa, e que representam centenas de estudantes. Vamos também entregar o certificado de participação àqueles estudantes da Universidade do Porto que obtiveram uma bolsa atribuída pelo programa Santander Universidades para realizar um período de mobilidade na América Latina, no Brasil e nos países de língua espanhola.
VE - O facto de haver tantos estudantes estrangeiros em Portugal pode ser uma oportunidade para as empresas nacionais desenvolverem novos projetos de internacionalização?
BC - Posso dizer que já temos sido contactados por algumas empresas nesse sentido. O último contacto que tive foi de uma empresa de recrutamento que tem sido solicitada por empresas que ou já estão em Portugal ou querem desenvolver atividade em Portugal num futuro próximo e procuram pessoas com nacionalidades específicas. Tivemos também contactos recentes para que os estudantes estrangeiros da universidade possam desenvolver trabalhos de part-time, como, por exemplo, guias na língua natal em certas instituições da cidade. Há sem dúvida nenhuma uma consciência que o facto de termos estudantes internacionais, seja Erasmus, seja ao abrigo de acordos de cooperação, sejam em todos os programas como o programa Santander Universidades, pode dar um contributo importante para o desenvolvimento da atividade económica na cidade.
VE – A internacionalização tem um efeito positivo para as receitas da universidade?
BC - Conforme referi, a nível de projetos internacionais, a Universidade do Porto tem conseguido angariar muito financiamento. A maior parte desse financiamento vai naturalmente ser aplicado nas bolsas dos alunos. Depois, também temos financiamento para suportar a compra de viagens, para o seguro, o que é benéfico para outras entidades externas à universidade. A agência de viagens é portuguesa, a seguradora também é portuguesa e o financiamento que cobre os custos quer com as viagens quer com os seguros também é europeia. Ao trazer financiamento para Portugal, para a Universidade do Porto estamos a beneficiar não só a universidade mas também outras estruturas à volta. Efetivamente, a universidade tem conseguido captar muito financiamento europeu. Este ano temos alguns projetos já aprovados, de acordo com a informação da nossa Agência Nacional de Erasmus.