Governo investe 5,5 milhões de euros no programa das “cabras sapadoras”
Abriram a 19 de fevereiro as candidaturas aos apoios no âmbito dos projetos-piloto dos rebanhos dedicados das chamadas ‘cabras sapadoras’, destinados à gestão do combustível florestal na rede primária determinada pelo Instituto Conservação da Natureza e Florestas (ICNF).
Em entrevista à “Vida Económica”, o secretário de Estado das Florestas, Miguel Freitas, adianta que o montante financeiro associado é de 5,5 euros a cinco anos, dois milhões dos quais destinados a apoiar a instalação de pastagens. Com o pacote completo — para fazer os 1000 hectares a começar com 200 hectares de instalação e 200 hectares de manutenção —, os detentores do rebanho e/ou da terra “recebem 200 mil euros ao final de cinco anos”.
Vida Económica – Qual é o incentivo financeiro que o Governo vai atribuir ao projeto das chamadas ‘cabras sapadoras’?
Miguel Freitas – Vamos fazer um programa para cinco anos. Assinamos um contrato ou com o detentor da terra ou com o detentor do rebanho, isto é, se for com o detentor da terra, ele tem de provar que tem um rebanho para fazer a ação, se for com o detentor do rebanho ele tem de mostrar que tem um contrato com o detentor da terra para poder pastorear.
Vamos fazer uma área mínima de 100 hectares e uma área máxima de 200 hectares e para 200 cabras, que é aquele que é um rebanho normal dedicado, porque isto é para pastorear a chamada rede primária de defesa da floresta contra incêndios, ou seja, aquelas grandes autoestradas de 125 metros que têm de ser abertas para proteger a floresta. Haverá um encabeçamento de uma cabra por hectare. Uma cabra real. À instalação dos 200 hectares nós pagamos 120 euros por hectare. No segundo ano eles fazem mais 200 hectares novos e nós pagamos mais 120 euros por hectare e 25 euros por cada hectare que mantêm. No fundo, no primeiro ano pagamos 120 [euros por hectare] e permitimos que já haja alguma manutenção, no segundo ano obrigatoriamente no contrato que assinam connosco fazem mais 200 [hectares] mais os 200 que mantêm, no terceiro ano pagamos 120 [euros por hectare] pelos novos hectares mais 25 [euros] mais 25 [euros], no quarto ano pagamos 120 [euros por hectare] pelos novos [hectares] mais 25 [euros], mais 25 [euros], mais 25 [euros] e no quinto ano pagamos 120 [euros por hectare] pelos novos, mais 25 [euros], mais 25 [euros], mais 25 [euros], mais 25 [euros]. Com um rebanho de 200 cabras, a pessoa vai gerir, ao final de cinco anos, 1000 hectares. Este é o grande objetivo do programa: gerir 1000 hectares. Será a gestão destes 1000 hectares, com a possibilidade de pagarmos uma cerca amovível por rebanho até 2000 euros. As cercas são necessárias para confinar a gestão de combustível para quando há maior intensidade de mato poder ter o rebanho mais concentrado para pastorear a área até ficar limpa.
VE – E também haverá apoios à pastagem, certo?
MF - Para além disso, as cabras não podem comer só mato. Portanto, vamos pagar também a possibilidade de instalação de uma pastagem até 5000 euros, que dá para instalar cerca de 20 hectares de pastagem. As contas que fazemos são: com o pacote completo – para fazer os 1000 hectares a começar com 200 hectares de instalação e 200 hectares de manutenção —, recebem 200 mil euros ao final de cinco anos. É um valor razoável para fazer o encontro entre o interesse do detentor das cabras e o interesse do detentor da terra. Porque é preciso compatibilizar estas duas realidades. E isto é feito essencialmente na rede primária e em áreas determinadas pelo ICNF [Instituto Conservação da Natureza e Florestas], que determinou quais são as áreas prioritárias para instalarmos estes rebanhos.
VE - Qual é o montante financeiro total que o Governo vai disponibilizar para este efeito. E quantos rebanhos serão apoiados?
MF – Serão 3,5 milhões de euros para o programa de cinco anos e, nesta fase, deveremos apoiar entre 20 e 30 rebanhos. Neste momento temos três rebanhos dedicados em Portugal e eles têm de ser mesmo dedicados. Primeiro, não podem ficar estabulados, têm de deixar de estar para poderem assumir esta tarefa. Em segundo lugar, ao passarem a esta prestação de serviço, que é o que nós pagamos, há uma perda de rendimento, quer em leite, quer em carne. E nós estamos a pagar uma compensação ao produtor para ele fazer esta atividade.
VE – E há recetividade a estas medidas?
MF – Nós discutimos isto com as organizações de produtores, com os baldios, com as associações de criadores, portanto isto foi devidamente equacionado, os valores encontrados foram devidamente consensualizados com os diferentes agentes. E é de referir ainda isto: a cabra, que é sapadora, é o animal de referência, o símbolo deste programa, mas ele pode estar associado a outro tipo de ruminantes, nomeadamente vacas, cavalos garranos, por exemplo, ou ovelhas, que são roçadoras.
VE – Estamos a falar de um projeto-piloto, certo?
MF – A ideia é ter um programa muito flexível. Estamos a testar, a fazer isto como projeto piloto em várias regiões. Vamos começar com Rio Maior, onde há um rebanho, na Serra da Estrela há outro, em Gavião outro, no Nordeste algarvio outro e Baião também apareceu agora como uma possibilidade. Acima de tudo vamos testar. Este programa, para além do apoio ao rebanho e à atividade, tem o apoio às raças autóctones, porque a maior parte das raças que fazem gestão de combustível são autóctones.
Mas, hoje mesmo também [19 de fevereiro], abrimos outro programa associado a este, que tem a ver com as queimadas controladas.
VE – Do que é que se trata?
MF – Qual é a ideia aqui? A maior parte da pastorícia, antes de ser feita, implica que haja alguma mecanização ou um fogo controlado para limpar a maior parte da vegetação para depois os animais entrarem. E estamos a fazer um apoio às queimadas para poder apoiar a silvicultura e a pastorícia, dando prioridade às áreas baldias, porque é aí que normalmente existe alguma incompatibilidade entre aquilo que são os interesses dos compartes e gestores do território e dos pastores que fazem transumância. Este programa procura resolver o conflito entre aqueles que fazem a queimada, que são os pastores, controlando-os, isto é, ser capaz de ter lá tecnicamente um controlo desse processo, e aquilo que são os pagamentos que vamos fazer. O pacote financeiro associado são dois milhões de euros. No fundo, o pacote global são 5,5 milhões de euros.
VE – Como vê a polémica instalada com algumas autarquias e a Associação Nacional de Municípios por causa das novas regras da limpeza das florestas?
MF – Como sabe, essa é uma matéria da competência do Ministério da Administração Interna. O Ministério da Agricultura defende a floresta. O Ministério da administração Interna tem competência naquilo que é a defesa de pessoas e bens. De qualquer maneira, nós achamos que todos têm de fazer aquilo que é possível. Se todos fizermos o que está ao nosso alcance, conseguimos atingir o objetivo. Em segundo lugar, nós definimos quais são as grandes áreas prioritárias. Definimos 19 regiões do país onde existe maior perigosidade de incêndio. Definimos, aliás, quais são os concelhos e as freguesias. E fomos mais longe: definimos as 6400 aldeias que estarão em risco de incêndio este ano. E, ao defini-las, a primeira mensagem que passámos é que a primeira grande prioridade é defender as aldeias, o coroamento das aldeias, os tais 100 metros à volta das aldeias, que é essencial. A segunda prioridade tem a ver com a proteção de áreas industriais, parques de campismo, portanto, zonas onde tenham atividades económicas importantes e que sempre que há um incêndio o prejuízo que está associado é muito elevado. Por outro lado, atividades onde está muita gente concentrada e é preciso proteger as pessoas. Não é possível fazer tudo, mas é possível fazer alguma coisa.
VE – Vai ser concedido algum incentivo financeiro às câmaras para ajudar a financiar estas novas competências?
MF – Sim. Há, por um lado, a ideia de que os proprietários têm a sua responsabilidade e devem fazê-lo. As autarquias entrarão supletivamente e terão uma linha de financiamento de 50 milhões de euros para apoiar essa atividade. Isto está devidamente enquadrado. O que as autarquias dizem é que, neste tempo, é difícil fazer tudo. É verdade. Mas, não fazendo tudo, é possível fazer escolhas. E as autarquias são as entidades que conhecem melhor o território para fazer essas escolhas.