Falecimento de familiar;

Falecimento de familiar
Faltas e adiamento ou suspensão das férias
Nota técnica da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT)


TEMA: 
- Faltas por motivo de falecimento de familiar 
- Adiamento ou suspensão do gozo das férias por falecimento de familiar 
 
INTRODUÇÃO: 
A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) foi questionada sobre a interpretação a dar às seguintes questões: 
1.ª Questão: Contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar 
- Quando se inicia a contagem das faltas por falecimento de familiar? 
- Devem ou não ser contabilizados os dias de descanso e feriados intercorrentes na contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar? 
2.ª Questão: Adiamento ou suspensão do gozo das férias por falecimento de familiar 
- A morte de familiar adia ou suspende o gozo das férias? 
 
ANÁLISE/DESENVOLVIMENTO: 
1.ª Questão: Contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar 
O início de contagem das faltas por falecimento de familiar inicia-se no dia do falecimento, podendo ser acordado momento distinto ou ser estabelecido outro momento por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (artigo 250.º conjugado com o artigo 3.º do CT). 
Se o falecimento ocorrer ao final do dia, após se verificar o cumprimento, pelo trabalhador, do período normal de trabalho diário, deve a contagem dos dias de ausência ao trabalho por motivo de falecimento iniciar-se no dia seguinte.  
Sobre a questão da contabilização ou não dos dias de descanso e feriados intercorrentes na contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar, destaca-se o entendimento perfilhado por João Leal Amado e João Reis1 que consideram o seguinte: 
- Resulta da lei que o trabalhador poderá faltar justificadamente ao serviço:
cinco dias consecutivos em caso de falecimento do seu cônjuge, do seu pai ou do seu filho; 
dois dias consecutivos caso faleça o seu avô ou o seu irmão; 
- Afigura-se óbvio que nesses dias não poderão ser computados os dias de descanso e/ou os feriados intercorrentes, pela simples razão de que nestes não se verifica qualquer falta ao trabalho; 
- Não se trata, pois, de cinco dias consecutivos de calendário, mas sim de cinco dias consecutivos de falta ao trabalho. 
Também Menezes Leitão2 analisou a questão relativa à contagem das faltas por falecimento de familiar, entendendo que na questão de saber se deverão ou não ser abrangidos os dias de descanso semanal ou dias feriados, a melhor posição parece ser a de que os dias que não sejam de trabalho não integram o período de dias consecutivos referidos na lei, dado que em relação a eles não se poria nunca a questão da falta. 
Sobre esta matéria também a jurisprudência3 entende que não se pode deixar de atender, para a contagem dos dias seguidos, ao conceito de falta ínsito na norma legal, sendo que esta, por força do artigo 248.º do CT, pressupõe a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário. Os dias seguidos têm de ser de reporte a dias de trabalho para que se possa falar em falta. 
Tendo em atenção que, nos termos do disposto n.º 1 do artigo 248.º do CT, considera-se falta a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário, na contagem das faltas por motivo de falecimento, não podem ser contabilizados os dias de descanso e feriados intercorrentes. 
Assim, não podem ser contabilizados os dias de descanso e feriados intercorrentes na contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar, por não existir ausência do trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário. 
Para o efeito, o trabalhador deverá cuidar de cumprir o dever de comunicação das faltas ao empregador (artigo 253.º n.º 2 do CT), bem como ter em conta que lhe pode ser exigido pelo empregador, nos 15 dias subsequente à comunicação da falta, prova do motivo (artigo 254.º, n.º 1 do CT). 
2.ª Questão: Adiamento ou suspensão do gozo das férias por falecimento de familiar 
A doutrina que se tem debruçado sobre este assunto, nomeadamente, Milena Rouxinol4, refere o seguinte: 
- O apuramento do conceito de impedimento não imputável ao trabalhador, previsto no artigo 244.º do CT, há de partir do conceito de impedimento para a prestação de trabalho; 
- O conceito genérico dos impedimentos para a prestação de trabalho remete-nos para duas figuras: a das faltas justificadas e a da suspensão de contrato por facto não imputável a trabalhador; 
- O apelo aos referidos institutos deve, todavia, fazer-se com as mais apuradas cautelas interpretativas, pois um impedimento para prestar trabalho não é, nem pode ser necessariamente um impedimento ao gozo de um período de repouso; 
- No que respeita à figura das faltas justificadas, as hipóteses previstas na alínea d) do n.º 2 do artigo 249.º do CT, consideradas justamente situações de impossibilidade de prestar trabalho devido a facto não imputável ao trabalhador não deverão ser as únicas a repercutir-se sobre as férias; 
- Deve equiparar-se-lhes a situação prevista na alínea b) do mesmo preceito (falecimento de cônjuge, parente ou afim), bem como a situação contemplada na alínea e) (prestação de assistência inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro do agregado familiar). 
Destaca-se, ainda, o entendimento perfilhado por Isabel Vieira Borges, na sua tese de doutoramento5, que analisou a questão nos termos seguintes: 
- A referência à doença funciona como uma cláusula geral que abrange todas as hipóteses atendíveis idóneas a impedir o gozo das férias por parte do trabalhador e que produzam efetivamente esse efeito. Por comparação, são análogos, todos os impedimentos que impliquem a equivalente impossibilidade de gozo ferial e de prossecução dos fundamentos de repouso e lazer; 
- Os impedimentos relevantes não podem ser equiparados aos impedimentos não imputáveis ao trabalhador que constituam facto suspensivo do vínculo nos termos gerais previstos no artigo 296.º do CT. A impossibilidade de gozo ferial é um resultado distinto da impossibilidade de cumprimento da prestação de trabalho; 
- Nem todos os motivos que justificam as ausências previstos no artigo 249.º, n.º 2 do CT podem constituir impedimento para efeitos do artigo 244.º; 
- Podem-no concretizar, as situações de, v.g. “falecimento de cônjuge, parente ou afim”, bem como as situações de “observância de prescrição médica no seguimento de procriação medicamente assistida, doença, acidente ou cumprimento de obrigação legal” e de “assistência inadiável e imprescindível a filho, a neto ou a membro de agregado familiar de trabalhador” conforme previsto no artigo 249.º, n.º 2 als. b), d) e e). 
A mesma autora, relativamente ao falecimento de familiar6 acrescenta que o falecimento do cônjuge, do parente ou do afim, no primeiro grau da linha reta, pode afetar de tal modo o estado psíquico e físico do trabalhador que este, pelo menos durante os cinco dias se sinta impossibilitado de gozar verdadeiramente as férias. A tristeza, a ansiedade, o  desânimo, a saudade e até as diligências, preocupação e tempo que envolvem a preparação e participação nas cerimónias fúnebres, não criam as condições adequadas ou sequer mínimas para o exercício de disponibilidade pessoal e do repouso físico e psíquico. 
Quanto a esta matéria, Maria do Rosário Palma Ramalho7 aponta que a justificação deste regime reside no objetivo de descanso e de recuperação física do trabalhador que subjaz ao direito a férias. Se o trabalhador estiver doente ou impedido de descansar, o tempo para tal descanso e recuperação física deve interromper-se. 
Sobre esta matéria a jurisprudência8 entende o seguinte: 
Reza o artigo 244.º, n.º 1 do CT que o gozo de férias não se inicia ou suspende-se quando o trabalhador esteja temporariamente impedido por doença ou outro facto que não lhe seja imputável, desde que haja comunicação do mesmo ao empregador; 
O busílis da questão está na interpretação a conferir à última parte do preceito, concretamente, saber a que é que se referia o legislador quando falou em “outro facto que não lhe seja imputável”; 
O legislador refere taxativamente que o facto não pode ser imputável ao trabalhador (a morte de um irmão não é um facto que possa ser imputável ao trabalhador) mas também exige que o trabalhador esteja temporariamente impedido de gozar férias. 
O gozo das férias não se inicia ou suspende-se quando o trabalhador esteja temporariamente impedido por doença ou outro facto que não lhe seja imputável, desde que haja comunicação do mesmo ao empregador (artigo 244.º, n.º 1 do CT). 
O falecimento de familiar a que se refere o artigo 251.º do CT podem justificar um adiamento ou uma suspensão de férias, na medida em que: 
1. Não dependem da vontade do trabalhador; 
2. Impossibilitam o gozo do direito a férias que visa o descanso e recuperação física do trabalhador. 
Verificando-se a suspensão, ou não se iniciando o gozo das férias, a ausência do trabalhador do local de trabalho, reger-se-á pelo regime de faltas previsto nos artigos 248.º e seguintes do CT. 
O trabalhador deverá cuidar de cumprir o dever de comunicação ao empregador (artigo 244.º n.º 1, parte final, conjugado com o artigo 253.º n.º 2 do CT), bem como ter em conta que lhe pode ser exigido pelo empregador, nos 15 dias subsequente à comunicação, prova do motivo (artigo 254.º, n.º 1 do CT). 
Findo o impedimento o gozo das férias terá lugar na medida do remanescente do período marcado, devendo o período correspondente aos dias não gozados ser marcado por acordo ou, na falta deste, pelo empregador, sem sujeição ao período de férias estabelecido no n.º 3 do artigo 241.º do CT. 
 
CONCLUSÃO: 
I - Contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar 
A contagem das faltas por falecimento de familiar inicia-se no dia do falecimento, podendo ser acordado momento distinto ou ser estabelecido outro momento por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho. 
Se o falecimento ocorrer ao final do dia, após se verificar o cumprimento, pelo trabalhador, do período normal de trabalho diário, deve a contagem dos dias de ausência ao trabalho por motivo de falecimento iniciar-se no dia seguinte. 
Não podem ser contabilizados os dias de descanso e feriados intercorrentes na contagem das faltas por motivo de falecimento de familiar, por não existir ausência do trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário. 
 
II - Adiamento ou suspensão do gozo das férias por falecimento de familiar 
O falecimento de familiar adia ou suspende o gozo das férias, na medida em que não depende da vontade do trabalhador e impossibilita o gozo do direito a férias que visa o descanso e recuperação física do trabalhador. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 
Isabel Vieira Borges - Tese de doutoramento - Férias Laborais: Dever de gozo efetivo e margem de liberdade – Universidade de Lisboa - Faculdade de Direito – Doutoramento em Ciências jurídicas. 
Isabel Vieira Borges - Breves considerações sobre alguns aspetos do regime do Direito a Férias (arts. 219.º, 212.º, n.º 4 e 215.º; 213.º, n.º 3 do Código do Trabalho) Memórias do XIX Congresso Nacional de direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 81-114. 
João Leal Amado e João Reis - Questões Laborais, Ano XIII, n.º 27, 2006, pág. 129 à 137 – Nótula sobre as faltas justificadas por motivo de falecimento de parentes ou afins (art. 227.º do Código do Trabalho). 
Maria do Rosário Palma Ramalho - Tratado de direto do trabalho, Parte II- Situações laborais individuais – 4.ª Ed, Almedina -2014. 
Menezes Leitão - Direito do Trabalho, 2.º Ed. Almedina, 2012; 
Milena Rouxinol - O direito a férias do trabalhador, Almedina, 2014, pág. 81 a 83 
 
Data: Agosto de 2018



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1 - In Questões Laborais, Ano XIII, n.º 27, 2006, pág. 129 à 137 – Nótula sobre as faltas justificadas por motivo de falecimento de parentes ou afins (art. 227.º do Código do Trabalho).
2 - In Direito do Trabalho, 2.º Ed. Almedina, 2012
3 - Vide sentença do tribunal de 1.ª instância de Viana do Castelo - Processo n.º 3519/15.5T8UCT
4 - In O direito a férias do trabalhador, Almedina, 2014, pág. 81 a 83
5 - Férias Laborais: Dever de gozo efetivo e margem de liberdade – Universidade de Lisboa - Faculdade de Direito – Doutoramento em Ciências jurídicas)
6 - In Breves considerações sobre alguns aspetos do regime do Direito a Férias (arts. 219.º, 212.º, n.º 4 e 215.º; 213.º, n.º 3 do Código do Trabalho) Memórias do XIX Congresso Nacional de direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 81-114
7 - In Tratado de direto do trabalho, Parte II- Situações laborais individuais – 5.ª Ed, Almedina, 2014
8 - Vide sentença do tribunal de 1.ª instância de Santa Maria da Feira- Processo n.º 683/14.4T8VFR.

 
 
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